Alea Jacta Est #14 – Geração Beat
A Contracultura, Bob Dylan, Johnny Depp, Kerouac, Ginsberg e Burroughs
Salve, salve!!! Salve-se quem puder…
Hoje vamos de Geração Beat, a famosa Contracultura e seus Beatniks.
Foto: John Clellon Holmes
Nestes tempos sombrios de fake news, falso conservadorismo, pseudo burgueses e ataques à Democracia em várias partes do globo, nada melhor do que tentar entender um movimento contrário a tudo isso que transformou o mundo.
O termo “Beatnik” é apenas um termo depreciativo criado pela imprensa da época para classificar jovens que imitavam o estilo Beat.
Antes de começar a leitura, curta a playlist do Universo Retrô: Pé na Estrada com sucessos do folk, rock e country americano dos anos 60 e 70, e músicos que se inspiraram ou embalaram a Geração Beat, como Bob Dylan e The Beatles.
Um movimento literário que mudou o mundo
O que foi a Contracultura?
Os “beats”: Jack Kerouac, Gregory Corso, Herbert Huncke, Neal Cassady, William Burroughs, Allen Ginsberg, Lawrence Ferlinghetti e Gary Snyder (Ilustração: Reprodução)
Cansados do conservadorismo sufocante e dos padrões burgueses dos anos 1950 vigentes nos EUA, da busca incessante pelo american way of life, estilo de vida consumista estabelecido na América após a Segunda Guerra Mundial, um pequeno grupo de jovens poetas e escritores resolveu botar tudo abaixo.
Eles queriam se expressar livremente contando sua própria visão de mundo e suas histórias num estilo de linguagem informal e sem pausas. Liderados por Jack Kerouac, o ícone, Allen Ginsberg, o poeta, e William Burroughs, o junkie, essa turma começou a produzir desenfreadamente, movidos a drogas, álcool, sexo livre e muito jazz, o gênero que mais os inspirou.
Ao som do jazz bop de Charlie Parker e Thelonious Monk, os poetas beat inspiram os jovens da época a questionar os conceitos de seus pais e as desigualdades sociais se opondo a todo o establishment e padrões estabelecidos.
A contravenção é uma forma de combater a hipocrisia e a alienação. Estas mentes inquietas e efervescentes buscavam descobertas e desejavam mudanças. A Geração Beat acaba criando uma contracultura, que como o próprio nome sugere, vai contra tudo que ali estava.
A liberdade levada ao extremo com o objetivo ilimitado de serem eles mesmos, incluindo sexo e drogas de todos os tipos, cores e sabores, é a marca registrada do movimento.
“Estou fodido” (I´m beat), dizia Herbert Huncke, amigo de Jack Kerouac. Ele, um jovem marinheiro, ex-jogador de rugby, é considerado o precursor do movimento, adotou a expressão em seus escritos. “Beat” também pode significar manter os “olhos abertos”, a “percepção”; a transformação do caos, da indignação por algo novo.
On the Road, de Jack Kerouac, é um livro acusado de causar fugas de casa em massa por parte de adolescentes insatisfeitos com o tradicionalismo doméstico. Vários deles continuaram num estilo de vida alternativo que culminou com a criação de outro movimento, os hippies, e de seu maior símbolo: o festival de Woodstock em 1969.
Na conta da Geração Beat podemos acrescentar a resistência como modo de vida tornando a geração um símbolo da contracultura. Além dos hippies nos anos 60, passando pelos punks dos 70, o tropicalismo e toda cultura underground até chegar nos indies de hoje, uma gama de jovens que depois se tornaram astros do rock e pop foram fortemente influenciados após ler obras dos poetas beat. A lista de influenciados é imensa: Bob Dylan, Mick Jagger, Joni Mitchell, Pati Smith e tantos outros.
Como disse André Bueno em O que é a Geração Beat (1984):
Difícil imaginar a obra de Sam Shepard, de Bob Dylan, de Charles Bukowski, de Jim Morrisson, de Lou Reed, de Tom Wolfe, de Bret Easton Ellis, de Joni Mitchell, de Wim Wenders, de Hunter Thompson, de Neil Young, de Jim Jarmush, de Jay Maclnerney, de Beck, de Bono, de Tom Waits, de Gus Van Sant (...). Todos eles pagam tributo à franqueza fluída e generosa do católico louco e místico que viu a luz nos trilhos e trilhas da América.
Também tivemos as mulheres poetas Beat, uma geração de mulheres que também fez parte do movimento. Destacando Diane di Prima e seu livro “Memórias de uma Beatnik”.
Podemos dizer que sem a Geração Beat o mundo seria um lugar bem pior para se viver.
Medo e Delírio em Las Vegas
Um clássico da insanidade ao extremo
Uma das melhores atuações da carreira de Johnny Depp, sem dúvida. Benicio Del Toro também arrebenta. Aquela cena dos dois num bar chapados de ácido é antológica.
Os dois malucos alugam um conversível e partem pra Las Vegas em busca de inspiração para escrever uma matéria. Acabam torrando o pagamento todo em drogas antes de fazer o artigo.
O filme é baseado no livro de Hunter S. Thompson, um jornalista pirado que criou seu próprio estilo de mergulhar a fundo no assunto ou notícia, muitas vezes vivenciando o tema, sair dele e descrever sua própria experiência.
O livro acabou revolucionando os fundamentos do texto jornalístico e alçou Hunter Thompson a grande cronista da liberdade nos EUA dos anos 1960.
Segue o trailer:
Rolling Thunder Revue: A Bob Dylan Story (Martin Scorsese)
Músico ou ator?
A mítica turnê de 1975 de Bob Dylan e sua trupe pelos EUA pelas lentes de Scorsese. Meio documentário, meio show ao vivo, a viagem musical usa a música de Dylan para mostrar os EUA passando por mudanças profundas e o próprio Dylan consolidando sua aura mítica.
Feito em 2005, mistura realidade e ficção e até mesmo uma entrevista do músico após vários anos se recusando a falar com a mídia. Tipicamente Dylan.
Leia essa crítica, se quiser entender melhor o mockumentary.
E veja o trailer:
Se quiser ver outros filmes e documentários sobre os beatniks, veja essa ampla lista.
Na Estrada / On the Road, Jack Kerouac
Liberdade, Liberdade…
O livro narra em detalhes a inesquecível viagem de sete anos de dois amigos, Sal Paradise (Jack Kerouac) e Dean Moriarty (Neal Cassady), cruzando os EUA pela lendária Rota 66, com várias incursões ao México.
Saindo de Paterson, New Jersey, até a costa oesto do país, eles finalmente chegam a São Francisco após muita aventura, álcool, sexo e liberdade.
O livro foi escrito em apenas três semanas em uma sequência de grandes folhas de papel que depois foram coladas com fita. Tudo para Jack não ter de trocar de folha toda hora perdendo o momento, tamanha era sua inquietude literária. O estilo de escrita não se preocupava com pontuação e parágrafo.
Em 2012, o livro virou filme pelas mãos do diretor brasileiro Walter Salles.
Tenho o livro, comprado há anos, mas ainda não li. Imperdoável.
Uivo e Outros Poemas / Howl, Allen Ginsberg
Gírias e palavrões em forma de poesia
Considerado o poeta ideólogo, pensador e agitador do movimento, foi a ponte para as futuras gerações. Reza a lenda que seus cabelos compridos, sua barba e as coloridas batas, compradas em viagem à Índia, foram a inspiração para o visual dos hippies.
O livro foi publicado em 1956 e defende a liberdade de expressão e as mais diversas causas libertárias, como a liberdade sexual, emancipação das mulheres e homossexuais, a luta contra o racismo e condenação da guerra.
Ginsberg uiva e grita usando uma poesia próxima da dicção das ruas numa linguagem popular, cheia de gírias e palavrões, fluxo de pensamento caótico e intenso em tudo. Bem distante da linguagem rebuscada utilizada na poesia até então.
Almoco Nu / Naked Lunch, William S. Burroughs
Luxúria no almoço
O junkie usou e abusou das drogas, foi internado várias vezes passando por reabilitação e tratamentos. Foi até a América do Sul estudar a ayahuasca e matou a própria mulher com um tiro ao tentar acertar um copo equilibrado sobre sua cabeça. Conseguiu se livrar das drogas aos 45 anos.
“Almoco Nu” é uma descrição das aventuras de Burroughs pelos EUA, México e até Tangier no Marrocos. Transita entre sua própria loucura e alucinações por uso de drogas e violência das cenas descritas, além de ácidas críticas políticas.
Na introdução, o autor apresenta a obra como “anotações detalhadas do delírio e da doença”, fruto de quinze anos de dependência das drogas.
O livro deveria ser chamado “Naked Lust”, "luxúria nua”, mas um dia Kerouac foi visitar William e leu errado o título no manuscrito. Perguntou qual era o significado de “Naked Lunch” e o poeta junkie gostou mantendo o título.
Nesta lista temos nove livros para conhecer melhor a Geração Beat. Além das três obras primas da Contracultura já citadas e “Medo e Delírio em Las Vegas”, temos outras cinco.
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