Salve, salve!!! Salve-se quem puder.
Os Estados Unidos da América é uma nação em decadência e eles sabem disso. E não é por causa do Trump, apesar dele.
Por do sol em Panama City, Flórida (2024, arquivo pessoal)
Voltei ontem de viagem a trabalho pela Flórida & Texas e pouco me agradou. Não vi um único painel solar no telhado das casas do Sunset State. Bicicletas, só duas em San Antonio numa avenida com dois jovens apostando corridas à noite.
A sociedade do consumo e o capitalismo raiz continuam a todo vapor com suas mega camionetes e caminhões ultrapassados. As trombetas do Apocalipse ambiental estão mudas por essas bandas, infelizmente.
Fiz a playlist “Uber soundtrack in Florida & Texas” inspirada nas músicas ouvidas durante as corridas de Uber entre aeroportos, hotéis, clientes e restaurantes pela semana. Obrigado, Richard, Paul, Abdullah e Shazam, claro.
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Também comecei a escrever crônicas, mas liberadas apenas aos assinantes. São causos do cotidiano e coisas da Vida em textos curtos, rápidos e rasteiros para serem lidos enquanto você bebe um café em casa ou na pausa do trabalho. Obrigado pela leitura.
América ladeira abaixo
“In God we trust”
Pick-up politicamente incorreta (2024, arquivo pessoal)
Em 2016 foi a penúltima vez que pisei em solo norte-americano. Desci em Washington Dulles, pulei num carro alugado e fui pra casa da minha prima que ali morava há anos. Nem saímos de casa. Cerveja, churrasco e papo sem fim. No dia seguinte, segui pra York a trabalho. Na volta ouvi no rádio que o Prince havia morrido, um dos gigantes.
Oito anos se passaram e pouca coisa mudou. Os balofos estão por toda parte e não é gordofobia, não. São do tamanho das pick-ups gigantescas que infestam ruas e estradas num exagero descabido. Gastam um mundo de combustível, são poluentes, pouco eficientes e servem pra esconder a pequenez de seus donos protegidos por insulfim.
Um VW Up! ou um Cinquecento seriam esmagados como baratas por esses monstros. Os caminhões então, melhor nem comentar. Ultrapassados, beberrões e ainda andam na pista da esquerda.
Nessa terra tudo é descartável e falso. O bom dia da recepcionista do hotel te chamando de “Sweetieeee!!!”, o café ralo e intragável servido em galões enormes, a manteiga branca e sem sabor no desjejum, o pão de forma industrial feito com pouco trigo, o suco de laranja “100% natural” contendo corante alaranjado e sabe-se lá mais o que, os pratos e talheres de uso único transbordando diariamente lixos e usinas de processamento, sujando ruas, bairros e cidades.
Como é difícil comer de forma saudável nessa terra. Frutas eu vi: melão e abacaxi cortados em pedaços gigantes, além de banana e laranja “in natura”. Iogurte, só de vanilla. Pra minha surpresa, achei um muesli decente pra jogar por cima. O resto é comida calórica e pobre logo no café da manhã. E a turma come com gosto. É o que mais sabem fazer: comer, sentar e não fazer nada.
Como podem comer tão mal?
A essência do Capetalismo
Uma nação que se diz desenvolvida com suas universidades Ivy League caríssimas e cada vez mais inacessíveis, o Vale do Silício e sei lá quantos unicórnios é incapaz de oferecer um sistema de saúde digno aos seus cidadãos. Muitos morrem antes mesmo de chegar aos hospitais, pois não têm dinheiro para o plano de saúde e muito menos para consultas regulares ao médico. Vão levando até onde não poderem mais. O SUS, tão criticado pela direita histérica, não existe na terra do Tio Sam, o açougueiro moedor de gente.
As pessoas simples são as mais simpáticas e cordiais. Os motoristas do Uber, um deles com gosto musical invejável pra rock e punk rock, vide playlist acima e um outro do Afeganistão que se esforçava no inglês. O segurança do aeroporto, o atendente do Starbucks, a garçonete hondurenha da churrascaria, o educado garçom do restaurante no hotel que nos perguntava a cada cinco minutos se estava tudo bem e precisávamos de alguma coisa.
É essa a turma que precisa de carinho e atenção das autoridades. Educação e oportunidades, principalmente de saúde pública gratuita de qualidade.
De nada adianta ter as chamadas Magnificent Seven - Alphabet (Google), Amazon, Apple, Microsoft, Meta (facebook), NVIDIA e Tesla - puxando o S&P500 a níveis jamais vistos fazendo o valor das empresas dos EUA ter disparado nos últimos 25 anos em comparação ao resto do mundo. Uma nação onde se consegue levantar US$ 100 milhões antes mesmo de poder comprar seu primeiro terno graças ao mercado de venture capital do Vale do Silício. Mas convivem com uma epidemia de opióides matando mais do que numa guerra em seu próprio quintal.
Quando máquinas automáticas nos aeroportos dão acesso a remédios a qualquer pessoa que queira comprá-los, alguns somente com receita aqui na Europa, é por que a coisa não anda bem.
Aeroporto de Houston (2024, arquivo pessoal)
Numa conversa via zap outro dia, um amigo que vive há 15+ anos em San Diego e trabalha num banco de investimentos mandou essa:
“E a essência do capitalismo. Os mais eficientes, espertos, estudados, inteligentes, acumulam…os mais ineficientes, cansados, menos estudados, terão menos, precisarão se esforçar mais. Meritocracia.
Justiça não significa distribuição igual de renda. Significa iguais direitos. O ativo gerado e criado pelos mais hábeis e distribuídos igualitariamente por todos independente do que fizeram para obtê-lo gera na verdade a má distribuição de renda… A sociedade que vocês imaginam faz sentido se ainda vivêssemos no mundo da escravidão… mas no mundo atual… Crie… trabalhe… vença!”
Discordo de tudo.
E ainda emendou: “Como disse Sartre: O mundo é o produto da vontade… então. Homem será antes de mais nada, resultado de seu próprio projeto!”
Outro amigo, mais sensato e vivendo em BH respondeu:
“Eu acreditava em tudo isso aí que você falou. Mas a vida tem me feito passar por algumas provações e atualmente não acredito em mais nada disso. Nada, nada, saí da caixa, nem em deus eu acredito mais. Na minha opinião, o capitalismo é o pior regime que poderia existir. Foi estabelecido por uns poucos que viram a oportunidade de "escravizar" quase a totalidade das pessoas no regime pagando uma esmolinha. Eu não acho que dentro dessa maioria escravizada não exista gente "eficiente, inteligente" que se esforça e que luta. Não é fácil escalar a pirâmide e os poucos que estão lá em cima desde muito tempo possuem todos os artifícios (poder, dinheiro, etc.) para não te deixar chegar lá.”
Concordo com tudo.
Li outro dia que o déficit fiscal americano está pior que o da Itália. E a previsão sombria é de crescimento de cerca de US$ 1 trilhão nos próximos 10 anos. A máquina de imprimir dólar e rolar o teto da dívida para as próximas gerações dá sinais de fadiga e decadência.
Nicholas Nassim Taleb, que não costuma errar, disse recentemente: "EUA enfrentam 'espiral da morte' na dívida".
A China está colada no retrovisor, dando seta pra passar. É só questão de tempo e ambos sabem disso. Vide BYD x Tesla.
Minimalismo – Matt D'Avella (2016)
Menos é Mais
Num país de exageros e consumo superlativo, há quem pense e tente fazer algo diferente para reverter a roda do capitalismo.
Faça um pequeno exercício e olhe ao seu redor. Veja quantas coisas você tem e realmente usa com frequência. Abra o armário e confira as roupas. Quando foi a última vez que usou cada peça? Se tem mais de um ano, pode doar sem pensar muito. E naquele quartinho lá na garagem ou no porão do prédio, naquelas caixas fechadas desde a última mudança, o que tem lá?
Sapatos então... brinquedos de criança, eletrodomésticos, e até ferramentas? Já conferiu a validade dos alimentos guardados na despensa? Metade tá vencida, pode olhar.
O que propõem os autores do documentário, o ex-publicitário norte-americano Ryan Nicodemus junto com o amigo e ex-empresário Joshua Milburn, é uma simplificação radical na Vida. Quanto menos coisas temos, mais fácil fica de gerenciar e manter. E, principalmente, de usar.
Além de fazer bem ao meio ambiente, fará um bem maior ainda na sua conta bancária. Aquele óculos de natação em ótimo estado não precisa ser trocado por um modelo mais novo. Pra que Alexa se você mesmo é capaz de trocar as músicas no Spotify?
Precisa mesmo ter um aplicativo que gerencia as luzes da casa? Se for pra reduzir a conta de luz e estiver conectado a painéis solares gerando energia verde, concordo que sim. Se não, é pura frescura e tiração de onda.
Seu carro usado pode ser trocado por outro usado, menos rodado. Deprecia menos do que um novo e você contribui aumentando a vida útil do veículo. No ano passado eu mesmo comprei um carro de 2011 ao invés de fazer um leasing, e uma dívida, pra adquirir um zero km.
Pense bem antes de comprar algo. Simplifique sua Vida o máximo que puder e irá respirar melhor. Além da casa ficar mais bonita e fácil de limpar.
Tem o doc no Netflix, mas você pode assistir na íntegra abaixo:
The End of the World is Just Beginning – Peter Zeihan (2022)
Fim do mundo é relativo
Escrito sob a ótica de um autor norte-americano fica fácil concordar com o título do livro. Para os EUA como superpotência dominante até outro dia, o mundo está realmente acabando.
Segundo Peter Zeihan, “2019 foi o último grande ano para a economia mundial.”
Ele sustenta que durante gerações “tudo ficou mais rápido, melhor e mais barato. Chegamos ao ponto em que quase tudo que você desejasse poderia ser enviado para sua casa dentro de alguns dias – ou mesmo horas - a partir de quando você decidisse que queria”.
Graças a América - quem mais? - isso foi possível, mas agora perderam o interesse em continuar.
A proteção da Marinha dos EUA garante as cadeias de abastecimento globais. Os mercados de energia e financeiros internacionais são sustentados pelo dólar americano. Indústrias complexas e inovadoras foram criadas para satisfazer os consumidores americanos e o mundo inteiro se beneficiou disso.
O autor insiste que a política de segurança americana forçou nações em guerra a deporem suas armas. E que bilhões de pessoas foram alimentadas e educadas à medida que o sistema comercial liderado pelos EUA se espalhava pelo mundo.
Agora tudo isso que foi artificial e temporariamente sustentado está acabando.
A partir de agora, os países ou regiões não terão outra escolha senão produzir seus próprios produtos, cultivar seus próprios alimentos, garantir a sua própria energia, travar suas próprias batalhas e fazer tudo isso com populações diminuindo e envelhecendo.
Ufa, finalmente consegui concordar com algo. A parte final da última frase.
Rolê aleatório
O que mais aconteceu por aí?
Ø A incrível história do G-Shock, o relógio “indestrutível”
Ø Livros essenciais que os homens deveriam ler antes de morrer (só li o do Bourdain)
Ø A única mudança que você deveria fazer no dia 1° de janeiro
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"Oi Pedro, curti o texto. A última vez que pisei deve ter sido, sei lá, 2008. Deve ser mesmo chocante pisar lá hoje. Gostoso de ler. (Assim que descer as escadas mando uma foto significativa sobre San Antonio, rsrs). Bom domingo!"
Bruno Berlendis (HnW)
"A playlist tá de foder 🙏, texto excelente, acho que com o Trump, vai avançar muito a degradação deles."
Cristiano Amaral, o McLoud (HnW)